Processo vaticano: gendarmes interrogados. Em 23 de novembro, a vez de Perlasca
Salvatore Cernuzio – Pope
Três gendarmes, um consultor da polícia judiciária e um arcebispo (cuja permanência no banco das testemunhas durou exatamente dois minutos) foram interrogados na manhã desta quarta-feira, 19 de outubro, na trigésima primeira audiência do processo pela gestão dos fundos da Santa Sé. Os interrogatórios das testemunhas convocadas pelo Gabinete do Promotor de Justiça continuam; à lista - anunciada en passant pelo presidente do Tribunal vaticano, Giuseppe Pignatone -, se acrescenta para 23 de novembro e também para os dias 24 e 25 o ex-chefe do Escritório administrativo da Secretaria de Estado, monsenhor Alberto Perlasca, considerado a "testemunha-chave".
As investigações dos gendarmes
O foco da sessão desta quarta-feira, que durou cerca de 7 horas, foram os procedimentos utilizados pela Gendarmaria vaticana para as investigações: averiguações bancárias, dados analisados em dispositivos apreendidos (celulares, iPads, computadores), aplicativos de mensagens criptografadas, imagens capturadas por câmeras de segurança. Entre elas estavam fotos da administradora Cecilia Marogna transferindo para contas correntes pessoais o dinheiro pago pela Secretaria de Estado para uma "operação humanitária", utilizado, ao invés, para a compra de bens pessoais de luxo.
Uma pergunta ao arcebispo Pennacchio
O primeiro a se submeter às perguntas da acusação, da defesa e das partes civis foi o inspetor Luca De Leo, o mais longo dos quatro interrogatórios, interrompido pelo depoimento muito rápido de dom Rocco Pennacchio. O arcebispo, atual pastor de Fermo, que da cidade da região italiana das Marcas veio de automóvel na manhã desta quarta-feira como testemunha da acusação, foi ecônomo da Conferência Episcopal Italiana. A ele teria recorrido o cardeal Becciu para "defender" o financiamento à Diocese de Ozieri, em particular à cooperativa Spes guiada por seu irmão Antonino. Pennacchio tinha pedido para testemunhar em um momento específico devido a outros compromissos. No tribunal, o promotor Alessandro Diddi perguntou-lhe se confirmava o interrogatório de 27 de setembro de 2021, feito durante a fase de subdivisão do julgamento em duas seções, que permaneceu em segredo. "Sim". "Tudo bem, não tenho mais perguntas". Também não houve perguntas da defesa, portanto, o arcebispo foi dispensado dois minutos depois.
Inspetor interrogado
Interrupção à parte, das 9h40 até cerca das 13h, Luca De Leo, técnico informático do Centro de Segurança da Gendarmaria, explicou a atividade realizada: "Tudo a ver com dados, sempre a pedido do Promotor". Portanto, ouvindo interceptações, interrogatórios, extrações e aquisições de computadores, smartphones e contas de e-mail, buscas. Incluindo as de 1º de outubro de 2019 na Secretaria de Estado ou no quarto de Perlasca na Casa Santa Marta.
Os dispositivos apreendidos e analisados
No total, explicou o gendarme, os dispositivos adquiridos, analisados e inseridos nos registros foram 243. Das 210 cópias feitas, 37 dispositivos foram utilizados pelo Promotor de Justiça para a investigação, incluindo 9 telefones celulares e 17 computadores. Um dado que reacendeu a polêmica no início do julgamento entre os advogados de defesa por terem recebido apenas material "parcial". Polêmica reprimida por Pignatone, que recordou a ordem de 1º de março de 2022, na qual "o Tribunal disse que o Promotor tinha o direito, de acordo com o Código, de selecionar o material que desejava. Vocês apelaram, não concordam, mas não podemos reabrir esta discussão toda vez".
Pesquisas e aplicativos
Falando do "grande trabalho" feito, De Leo explicou em detalhes e tecnicamente como ele havia realizado suas investigações: desde extrações e downloads, até buscas por palavras-chave e indicações de tempo. Em alguns casos, os gendarmes se depararam até mesmo com dados apagados. Por exemplo, no smartphone de Tirabassi, que estava usando um aplicativo "muito seguro", Confide, que permite ler mensagens somente passando o dedo sobre: "Depois a mensagem se autodestrói". Mincione e Torzi também o utilizavam: "Não havia como recuperar essas conversas".
"O documento dos 3%"
Foi projetada na parede uma carta datada de 17 de abril de 2019 na qual a Secretaria de Estado garantia ao corretor Torzi 3% do valor do imóvel londrino. De Leo explicou que o documento tinha sido preparado em novembro de 2018, depois impresso em abril de 2019 com mudanças substanciais. Segundo a acusação, confirmada pela testemunha, a carta - apelidada de "o documento dos 3%" - só existia virtualmente: "Jamais uma cópia física". Ou, de qualquer forma, nunca foi encontrado durante as várias buscas. Como as que foram feitas nas habitações de Tirabassi, das quais - disse o gendarme – foram levadas "37 caixas".
As transferências bancárias de Cecilia Marogna
A segunda testemunha, o gendarme Luca Bassetti, da seção de polícia judiciária, explicou a investigação do caso da administradora sarda Cecilia Marogna. Bassetti explicou que nove transferências foram feitas "para alimentar as contas" da Logsic, a empresa na Eslovênia da qual Marogna era a única proprietária, e da empresa de inteligência britânica Inkermann, beneficiária de duas transferências de 500 mil euros cada uma, que deveria gerir a missão de libertar a freira na República de Mali.
"Voluntary contribution for humanitarian missions. A contribuição voluntária para a operação humanitária" foi a razão de cada transferência, como encontrado em chats WhatsApp entre Perlasca e Becciu, onde o cardeal também especificou quantidades e iban. A partir dessas conversas, o gendarme relatou uma mensagem na qual o cardeal, em 2018, não mais substituto da Secretaria de Estado, solicitava a Perlasca que precisava de 14.150 euros imediatamente "para iniciar a famosa operação". "Pessoalmente", ele relataria outros detalhes.
Alerta da AIF
Bassetti também relatou um alerta da AIF (agora ASIF) acerca de uma "transação suspeita" em um depósito em dinheiro no dia 4 de setembro de 2018 de oito notas de 500 euros. No dia anterior, em 3 de setembro, Marogna havia retirado mil euros da conta Logsic para depositá-los em sua conta pessoal em um banco na Rua de Porta Angelica, na fronteira do Estado da Cidade do Vaticano. Isto foi confirmado pelas imagens das câmeras da polícia de fronteira. Também surgiu da análise que Marogna havia usado o dinheiro da conta eslovena para pagar duas pernoites em hotéis quatro estrelas na Sardenha.
Quando questionado pelas partes civis, o gendarme explicou que, na época dessas transações, Becciu não era mais substituto e que, em uma conversa, Perlasca relatou que seu sucessor, o arcebispo Edgar Peña Parra, havia expressado reclamações sobre os pagamentos, das quais ele não tinha conhecimento. Bassetti confirmou que estes pagamentos foram feitos pelo banco Credit Suisse, por ordem de Tirabassi, através de um e-mail institucional anexado com a ordem de pagamento do substituto, o único com poder de assinatura.
As contas de Tirabassi
À tarde, o interrogatório a Luigi Cosi, auxiliar da Polícia Judiciária, engajado na investigação das contas de Tirabassi: cerca de uma dúzia abertas na Ubs Suíça. O interrogatório voltou às questões da empresa com o falecido pai dele Onofrio, das moedas e medalhas encontradas em Celano, e das casas, carros e estadias do réu nas montanhas. O qual, disse Cosi, teria 1,9 milhões de euros apreendidos na Suíça.
Financiamentos em Ozieri
Para finalizar, o testemunho do gendarme Gianluigi Antonucci sobre o financiamento da Secretaria de Estado para a cooperativa Spes em Ozieri. A testemunha, que havia participado da busca na diocese sarda, reiterou argumentos e hipóteses que já haviam surgido em audiências anteriores. Ele explicou que os lucros obtidos pela Spes "não foram para a Caritas" e que a documentação mostrava "contribuições de um milhão e 260 mil euros em três anos por parte da Spes".
Em seguida, foi projetada uma carta do bispo Sebastiano Sanguinetti confirmando o "interesse" de Becciu pelo financiamento à cooperativa. Pignatone lembrou que já há uma carta nos registros e que o próprio Becciu admitiu ter "defendido" a operação, dizendo-se, aliás, "orgulhoso" de ter ajudado uma cooperativa que não fez nada além de bom para crianças pobres.
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