Gallagher: reconstruir o multilateralismo com justi?a social
Isabella Piro ¨C Pope
"Recuperar a noção de interdependência e reconstruir o multilateralismo em torno dos ideais de justiça social e responsabilidade mútua entre e dentro das nações." Foi o que disse o secretário das Relações com os Estados, dom Paul Richard Gallagher, em 5 de outubro, na 15ª Conferência Ministerial da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), realizada em modo virtual sobre o tema "Da desigualdade e vulnerabilidade à prosperidade para todos". Uma indicação urgente e necessária num contexto global no qual a pandemia da Covid-19 "levou à mais grave recessão desde a II Guerra Mundial". A emergência sanitária, de fato, "expôs dramaticamente as linhas de falha e as fragilidades existentes no modelo econômico vigente", com repercussões muito sérias sobre as pessoas mais frágeis e vulneráveis.
Extrema desigualdade no mundo contemporâneo
"A desigualdade extrema ressurgiu como uma característica predominante do mundo contemporâneo", continuou o arcebispo, sublinhando como as mudanças tecnológicas e a hiperglobalização estão causando a diminuição de salários de milhões de trabalhadores e o aumento da pobreza. O que fazer? Primeiramente, afirma dom Gallagher, não devemos "desperdiçar as lições" aprendidas com a crise atual, pois ela proporciona "uma oportunidade única para uma mudança sustentável" e para "um autêntico desenvolvimento humano integral", que só pode ser alcançado "quando todos os membros da família humana estiverem incluídos na busca do bem comum e puderem contribuir para ele".
Finanças a serviço do bem comum
Segundo o secretário das Relações com os Estados, este objetivo exigirá "mudanças importantes" em diversas áreas: por exemplo, "uma redistribuição de renda e o aumento da progressividade dos programas de imposto de renda", junto com uma "aplicação adequada da tributação das empresas, especialmente das multinacionais". Igualmente importante será "visar planos substanciais de reembolso para as dívidas públicas externas das economias em desenvolvimento", de modo que "a ética volte a desempenhar o seu legítimo papel no mundo das finanças e que os mercados, sirvam aos interesses dos povos e ao bem comum da humanidade". Depois, dom Gallagher convidou a "fortalecer a cooperação internacional e fornecer a cada país os meios apropriados para enfrentar os desafios atuais. Representaria um investimento na resiliência sistêmica".
Vacinas: necessária isenção de propriedade intelectual
Em tempos de pandemia, a questão da saúde e do acesso a medicamentos e vacinas é central, "um setor marcado por desigualdades significativas". A este respeito, o arcebispo sublinhou que a Santa Sé, desde o início, tem apoiado "uma derrogação às regras sobre propriedade intelectual da Organização Mundial do Comércio", pois este "seria um passo vital e necessário para acabar com a pandemia, permitindo o acesso adequado e rápido a vacinas, diagnósticos e tratamentos para todos os países". Tal renúncia, entretanto, "deve ser acompanhada pela garantia de uma partilha aberta de know-how e da tecnologia em matéria de vacinas".
Investir na descarbonização econômica
Outra sugestão do prelado diz respeito à "estabilização do clima e justiça climática". A este respeito, o arcebispo pediu o "investimento necessário na descarbonização de nossas economias, através da disponibilidade de fundos suficientes para atingir este objetivo". É essencial", explicou dom Gallagher, "encontrar uma maneira de conciliar polítca climática, industrial e social numa perspectiva integral". Deplorando o "vírus" de uma "ideologia individualista" que nas últimas décadas levou ao abandono de noções de "bem comum" e de "uma sociedade que cuida" de seu próximo, o prelado destacou a falta de "confiança e solidariedade" que corrói a sociedade contemporânea, impedindo-a de ser "justa e saudável".
É necessária uma nova ética do bem comum
Espera-se "uma nova ética do bem comum" que "constitui a base de uma política capaz tanto de abordar as desigualdades estruturais de nosso mundo profundamente dividido e cada vez mais frágil, quanto de liberar o espírito de engenhosidade e criatividade humana" que é "urgentemente necessário" para a reconstrução social pós-pandêmica. Segundo dom Gallagher, nas últimas décadas a Comunidade internacional tem sido "completamente incapaz ou, pior ainda, não quis apresentar propostas abrangentes para aliviar as dificuldades dos países e comunidades mais pobres". Mas agora, "num mundo cada vez mais interconectado", o apelo global para o desenvolvimento sustentável deve estar enraizado na "resiliência sistêmica do mundo". Por esta razão, o representante da Santa Sé enfatizou que "chegou a hora de recuperar a noção de interdependência e reconstruir o multilateralismo em torno dos ideais de justiça social e responsabilidade mútua entre e dentro das nações".
Garantir um futuro resiliente e próspero para todos
Somente assim, será possível "esperar calibrar a economia global" em direção da "estabilidade, prosperidade compartilhada e sustentabilidade ambiental", garantindo "um futuro resiliente e próspero para todos", no qual "possa ser banida a divisão do mundo em zonas de pobreza e abundância". O que é necessário é "uma mudança de ritmo significativa e necessária", concluiu dom Gallagher, "para reafirmar a centralidade do multilateralismo e relançar o diálogo sobre reformas reais no comércio, nas finanças e no desenvolvimento".
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