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O Papa encontra dois bispos chineses durante o Sínodo de outubro passado, realizado no Vaticano O Papa encontra dois bispos chineses durante o Sínodo de outubro passado, realizado no Vaticano 

Os encargos pastorais dos bispos chineses acolhidos na comunhão pelo Papa

Um artigo e uma entrevista do L'Osservatore Romano trazem notícias sobre a Igreja católica na China

Andrea Tornielli - Cidade do Vaticano

Um artigo publicado este sábado (02/02) pelo “L’Osservatore Romano” comunica notícias sobre a Igreja católica na China e informa sobre os encargos pastorais assumidos pelos bispos chineses acolhidos na comunhão com Roma pelo Papa Francisco na vigília da assinatura do “Acordo Provisório sobre a nomeação dos Bispos”.

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“Em 22 de setembro de 2018 em Pequim – lê-se no artigo – a Santa Sé e a República Popular da China assinaram um “Acordo Provisório sobre a nomeação dos Bispos.” Precedentemente, em 8 de setembro de 2018, após ter refletido e rezado muito, “o Sucessor de Pedro, com espírito de grande benevolência, havia acolhido na plena comunhão eclesial sete bispos chineses, consagrados sem mandato pontifício”.

“Em tal contexto, o Papa Francisco – continua a nota no L’Osservatore – convidou todos os prelados a renovar a total adesão a Cristo e à Igreja e recordou-lhes que, pertencendo ao povo chinês, devem ter respeito e lealdade às autoridades civis e, como bispos, são chamados a ser fiéis ao Evangelho, segundo o que Jesus ensina: ‘Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus’ (Mt 22, 21).”

Além disso, o artigo informa que o Papa “atribuiu a cada bispo uma tarefa pastoral diocesana, considerando as particularidades e situações locais complexas. Por conseguinte, Dom José Guo Jincai foi chamado a desempenhar o ministério episcopal como primeiro bispo de Chengde; Dom José Huang Bingzhang, designado bispo de Shantou; Dom José Liu Xinhong, bispo de Anhui; Dom José Ma Yinglin, bispo de Kunming; Dom José Yue Fusheng, bispo de Heilongjiang; Dom Vicente Zhan Silu, bispo de Funing/Mindong; e Dom Paulo Lei Shiyin, bispo de Leshan. Em relação a tais disposições, Dom Vicente Go Xijin assumiu o ofício de bispo auxiliar de Funing/Mindong, e Dom Pedro Zhuang Jianjian o título de bispo emérito de Shantou”.

Acerca do encargo pastoral deles, lê-se ainda no L’Osservatore Romano, os nove bispos “receberam a comunicação da Santa Sé em 12 de dezembro de 2018 em Pequim, no contexto de uma sóbria cerimônia marcada pela intensa comunhão eclesial e concluída com a oração do Pai-Nosso e o canto da Ave-Maria segundo uma melodia chinesa tradicional”.

Por fim, no artigo é definido “um fato de grande relevo eclesial que Dom Antonio Tu Shihua, O.F.M., alguns meses antes de seu falecimento ocorrido em 4 de janeiro de 2017, tenha pedido para ser readmitido na plena comunhão com o Sucessor de Pedro, o qual o acolheu com o título de bispo Emérito de Puqi”.

Para compreender o alcance eclesial e pastoral destes eventos, é oportuno retomar o que o Papa Francisco ressaltou na “Mensagem aos Católicos chineses e à Igreja universal” de 26 de setembro de 2018: “Justamente a fim de apoiar e promover o anúncio do Evangelho na China e de reconstituir a plena e visível unidade na Igreja, era fundamental tratar em primeiro lugar a questão das nomeações episcopais. É conhecido por todos que, infelizmente, a história recente da Igreja católica na China foi dolorosamente marcada por profundas tensões, feridas e divisões, que se polarizaram sobretudo em torno da figura do Bispo qual custódio da fé e assegurador da comunhão eclesial”. Agora é importante viver a unidade entre os católicos e “abrir uma fase de colaboração mais fraterna para assumir com renovado compromisso a missão do anúncio do Evangelho. De fato, a Igreja existe para testemunhar Jesus Cristo e o amor indulgente e salvífico do Pai”.

A Santa Sé, conclui a nota publicada no L’Osservatore, “continua comprometida no prosseguimento do caminho de diálogo, visando resolver gradualmente, com atitude de mútua compreensão e de perspicaz paciência, os vários problemas ainda existentes, a começar pelo reconhecimento civil do clero ‘não oficial’, a fim de tornar a vida da Igreja católica na China cada vez mais normal”.

O diário vaticano, ainda no número publicado na tarde deste sábado, traz em suas páginas internas também uma entrevista com o cardeal Fernando Filoni, Prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos, o qual ressalta o valor pastoral do “Acordo Provisório sobre a nomeação dos Bispos”. O cardeal, citando as palavras do Papa Francisco em sua Mensagem aos Católicos chineses, recorda que “o Acordo Provisório é fruto do longo e complexo diálogo institucional da Santa Sé com as Autoridades governamentais chinesas, iniciado por São João Paulo II e prosseguido pelo Papa Bento XVI. Através de tal percurso, a Santa Sé não tinha nada mais em seu ânimo – e não tem – a não ser realizar as finalidades espirituais e pastorais próprias da Igreja, ou seja, apoiar e promover o anúncio do Evangelho, e alcançar e conservar a plena e visível unidade da Comunidade católica na China”.

O Prefeito Filoni, “mesmo partilhando alguma perplexidade, expressa por diferentes partes devido a dificuldades que ainda permanecem e pelas que poderão manifestar-se no caminho”, afirma: “Sinto que na Igreja católica na China existe uma grande expectativa de reconciliação, de unidade, de renovação, por uma mais decidida retomada da evangelização. Não se pode permanecer estagnados num mundo que, de muitos pontos de vista, está correndo com velocidade supersônica mas que, ao mesmo tempo, experimenta a urgente necessidade de redescobrir os valores espirituais e humanos que deem sólida esperança à vida das pessoas e verdadeira coesão à sociedade. Numa palavra, tudo aquilo que o cristianismo pode oferecer à China de hoje”.

O cardeal recorda que muitos bispos, sacerdotes, religiosas e leigos desejam que “a Igreja na China volte à ‘normalidade’ no contexto da Igreja católica”; define o “Acordo Provisório” como sendo “de alcance histórico” e explica que à luz deste último “que reconhece o papel peculiar do Papa, se deveria agora reinterpretar também o chamado ‘princípio de independência’ na perspectiva da relação entre a legítima autonomia pastoral da Igreja na China e a imprescindível comunhão com o Sucessor de Pedro. Por isso – afirma ainda o purpurado –, espero não ter mais que ouvir ou ler acerca de situações locais nas quais se instrumentaliza o Acordo com a finalidade de obrigar as pessoas a fazer aquilo a que a própria lei chinesa não obriga, como inscrever-se na Associação Patriótica”.

A propósito dos problemas ainda existentes entre as comunidades chamadas “oficiais” e as chamadas “clandestinas”, Filoni ressalta: “É necessário, sobretudo, reconstruir a confiança, talvez o aspecto mais difícil, em relação as autoridades civis e religiosas prepostas para as questões religiosas e as chamadas correntes eclesiais, oficial e não-oficial. Aí, agora, não se trata de estabelecer quem vence ou quem perde, quem tem razão ou não. Nos sessenta anos da criação da Associação Patriótica, todos, de modo talvez desigual, mas dramático, sofreram, tanto em sentido físico, quanto moral. Não podemos ignorar nem mesmo as angústias interiores de quem tinha aderido, ou tinha sido obrigado a isso, ao princípio de ‘independência’ e, consequentemente, a ruptura das relações com a Santa Sé”.

“Eu me dou conta – acrescenta o cardeal na entrevista – de que alguém possa pensar que, nesta fase, a Sé Apostólica parece pedir um sacrifício unilateral, ou seja, somente aos membros da comunidade clandestina, os quais deveriam, por assim dizer, ‘oficializar-se’, enquanto aos ‘oficiais’, não se pediria nada. A questão não deve ser colocada nestes termos; de fato, não se trata de uma rendição dos ‘clandestinos’ aos ‘oficiais’ ou às autoridades civis, apesar das aparências, nem de uma vitória sobre a comunidade não-oficial. Numa visão mais eclesial não se pode falar de concorrência ou razão, mas de irmãos e irmãs na fé que se reencontram todos na Casa comum”.

Efetivamente, “na constante consideração da Santa Sé, sempre se disse que na China não existem duas Igrejas, uma ‘Igreja patriótica’ e uma ‘Igreja fiel’ (jargões habitualmente usados); na China a Igreja é una e as feridas que foram infligidas vêm de dentro e de fora. O sensus fidei do Povo de Deus salvou a Igreja na China do cisma. No contexto atual podemos dizer que existem as energias para curar dos sofrimentos; o objetivo é alto e será preciso a contribuição de todos para realizá-lo completamente”.

No mais, a propósito de dúvidas e perplexidades expressas após a assinatura do Acordo Provisório, o cardeal Prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos na entrevista diz compreendê-las. Mas acrescenta: “Não partilho a atitude de quem, mesmo mantendo suas legítimas reservas, não somente não se esforça para compreender também o ponto de vista dos outros, mas, sobretudo corre o risco de não remar em sintonia na barca de Pedro. O Papa, junto com seus colaboradores, fez, faz, e fará todo o possível para se aproximar da Igreja na China”.

 

Por fim, o cardeal Filoni observa: “Os chineses, como se sabe, gostam de similitudes. Gostaria de dizer ainda para completar meu pensamento: se se quer dar estabilidade a um trípode é preciso três apoios: na verdade, este não fica em dois suportes, ou seja, simplesmente no acordo entre Santa Sé e o Governo chinês; é preciso um terceiro suporte, isto é, a participação e a contribuição dos fiéis na China, bem como a participação da comunidade católica na diáspora. Somente com a contribuição de todos se pode construir a Igreja do amanhã, no respeito pelas liberdades, inclusive por parte das Autoridades civis, após sessenta anos de sofrimentos, de divisões e de incompreensões da comunidade católica. A Igreja, portanto, precisa da livre e fecunda participação de todos para construir harmonia civil, social e religiosa e para o anúncio do Evangelho.”

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04 fevereiro 2019, 13:30