Editorial: O direito de ser feliz
Silvonei José - Cidade do Vaticano
Na última segunda-feira, 10 de dezembro, comemoramos os 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Assembleia Geral da ONU em 1948.
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos recita a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que tem agora 70 anos, mas que certamente não está pronta para se aposentar, mesmo se a imagem Global parece estar indo nessa direção.
Podemos realmente celebrar essa grande conquista global sem olhar ao nosso redor? Sem fazer autocrítica, deixando espaço apenas para proclamações de circunstância? Basta olhar para o drama de milhões de crianças em todas as partes do mundo para entender que vivemos momentos escuros, perdidos, difíceis.
A realidade de hoje
Vivemos ainda na época dos centros de detenção na Líbia, dos campos de Moria e Nauru, onde a violência e o abandono levam crianças, sem mais esperanças ou proteção, ao suicídio. Lugares que as pessoas não veem, aos quais não prestam atenção, distraídos pelos gritos da polarização pseudopolítica de hoje. Sem esquecer os efeitos das grandes guerras atuais.
Hoje a realidade é bem mais complexa com relação a 70 anos atrás quando foi publicada a Declaração. O Papa Francisco no discurso ao Corpo Diplomático pronunciado no início deste ano e dedicado ao 70º aniversário deste importante documento constata que ¡°ao longo dos anos ¨C sobretudo depois das agitações sociais de 1968 ¨C, se foi progressivamente modificando a interpretação de alguns direitos, a ponto de se incluir uma multiplicidade de ¡®novos direitos¡¯, não raro contrapondo-se entre si. Isto nem sempre favoreceu a promoção de relações amigas entre as nações, porque se afirmaram noções controversas dos direitos humanos que contrastam com a cultura de muitos países, que, por isso mesmo, não se sentem respeitados nas suas próprias tradições socioculturais, antes veem-se transcurados nas necessidades reais que têm de enfrentar.
Consequentemente pode haver o risco ¨C de certa forma paradoxal ¨C de que, em nome dos próprios direitos humanos, se venham a instaurar formas modernas de colonização ideológica dos mais fortes e dos mais ricos em detrimento dos mais pobres e dos mais fracos.
Direitos violados
Setenta anos depois muitos direitos fundamentais são violados ainda hoje. E, primeiro dentre eles, - recordou Francisco ¨C é o direito à vida, à liberdade e à inviolabilidade de cada pessoa humana. A lesá-los, não são apenas a guerra ou a violência. No nosso tempo, há formas mais sutis: o Papa fala das crianças inocentes, descartadas ainda antes de nascer; às vezes não queridas, apenas porque doentes ou malformadas ou pelo egoísmo dos adultos. Fala dos idosos, também eles muitas vezes descartados, sobretudo se estão doentes, porque considerados um peso. Fala das mulheres, que muitas vezes sofrem violências e prepotências, mesmo no seio das suas famílias. Fala de todos aqueles que são vítimas do tráfico de pessoas.
Hoje persistem no mundo várias formas de injustiça, alimentadas por visões antropológicas redutivas e por um modelo econômico baseado no lucro, que não hesita em explorar, descartar e até mesmo matar o ser humano. Enquanto uma parte da humanidade vive na riqueza, outra parte vê sua própria dignidade renegada, desprezada ou pisoteada e seus direitos fundamentais ignorados ou violados.
Chamado a colaborar
Cada um é chamado a colaborar com coragem e determinação em prol do respeito dos direitos fundamentais de cada pessoa, especialmente as ¡°invisíveis¡±: aquelas que têm fome e sede, que estão nuas, doentes, estrangeiras ou detidas, que vivem às margens da sociedade ou são descartadas.
Para o Papa Francisco há um direito entre todos que é uma aspiração comum: ¡°O ser humano é uma criatura deste mundo, que tem direito de viver e ser feliz¡±. Os cristãos desejam realizar este direito à felicidade levando a todos a alegria do Evangelho: ¡°Deus deseja a felicidade dos seus filhos também nesta terra¡±. ¡°Por isso se consigo ajudar uma só pessoa a viver melhor, isso já é suficiente para justificar o dom da minha vida¡±.
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