"Discernir" e "acompanhar", as orientações do Papa à Vida Consagrada
Jackson Erpen – Cidade do Vaticano
“A vida consagrada nasce na Igreja, cresce e só pode dar frutos evangélicos na Igreja, na comunhão viva do Povo fiel de Deusâ€, disse o Papa no discurso na manhã deste sábado aos participantes da Plenária da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, recebidos em audiência no Vaticano.
Em sua reflexão - norteada pelas palavras “discernir†e “acompanharâ€, Francisco enfatizou alguns pontos, como manter viva a atenção aos fundadores, à pastoral vocacional e à formação, aos abusos de autoridade e de poder, bem como a importância da colaboração com os bispos e a sinergia destes com a Santa Sé.
“Tantos cardeais no Dicastério, isso parece quase um Conclaveâ€, começou brincando o Papa, ao agradecer as palavras a ele dirigidas pelo prefeito, o cardeal João Braz Aviz, bem como ao secretário D. José Rodríguez Carballo e a “todos os membros do Dicastério, presentes e ausentesâ€. O Santo Padre também agradeceu o trabalho que a vida consagrada realiza no serviço ao Evangelho, reconhecendo “não ser uma missão fácilâ€. Motivo pelo qual quis expressar sua proximidade “a todos quantos acreditam no futuro da vida consagrada. Estou próximo de vocêsâ€.
Francisco recordou então o espírito que animou São João Paulo II quando convocou o Sínodo dos Bispos sobre este tema. “Por um lado – explicou - havia a consciência de um tempo de trabalho, de experiências inovadoras, nem sempre com resultados positivos. Havia, e hoje mais ainda, a realidade da queda no número de vocações em diferentes partes do mundoâ€.
A "memória deuteronômica"
Não obstante essa realidade – observa - “prevalecia e prevalece a esperança, fundada na beleza do dom que é a vida consagrada:
Isso é decisivo: centrar-se no dom de Deus, na gratuidade do seu chamado, na força transformadora da sua Palavra e do seu Espírito. Com esta atitude encorajo-vos, a vós e a quantos, nos vários Institutos e nas Igrejas particulares, ajudam as consagradas e os consagrados, a partir de uma memória "deuteronômica", a olhar para o futuro com confiança.
E explicou o porquê da importância dessa “memória deuteronômicaâ€:
Essa mensagem do Deuteronômio: "Recorda Israel, recorda". Aquela memória da história, da própria história, do próprio instituto; aquela memória que é memória das raízes. E isso nos faz crescer. Quando perdemos a nossa memória, aquela memória das maravilhas que Deus fez na Igreja, no nosso instituto, na minha vida – cada um pode dizer -, perdemos as forças e não poderemos dar vida. Por isso digo memória "deuteronômica".
Discernir e acompanhar
Discernir e acompanhar: para Francisco, o serviço da vida consagrada pode ser resumido nessas duas palavras:
Conheço a multiplicidade das situações com as quais diariamente vocês se deparam. Situações muitas vezes complexas, que requerem serem estudadas em profundidade, na sua história, em diálogo com os Superiores dos Institutos e com os Pastores. É o trabalho sério e paciente de discernimento, que só pode ser realizado no horizonte da fé e da oração. Discernir e acompanhar. Acompanhar especialmente as comunidades recém-formadas, que estão também mais expostas ao risco da autorreferencialidade.
E a este propósito – observou o Santo Padre - “existe um critério essencial de discernimento: a capacidade de uma comunidade, de um instituto, de «integrar-se na vida do Santo Povo fiel de Deus para o bem de todos», como especificado na Evangelii Gaudiumâ€. “Este critério é decisivo para o discernimentoâ€:
“A vida consagrada nasce na Igreja, cresce e só pode dar frutos evangélicos na Igreja, na comunhão viva do Povo fiel de Deus. Por isso «os fiéis têm o direito de serem advertidos pelos Pastores sobre a autenticidade dos carismas e na fiabilidade de quem se apresenta como fundadorâ€, como escrito no Motu proprio , de 1º de novembro de 2020.
Aspectos a receberem atenção constante
Ademais, ao trabalho de discernir e acompanhar, são necessárias algumas atenções a serem mantidas sempre vivas:
A atenção aos fundadores que às vezes tendem a ser autorreferenciais, a se sentirem os únicos depositários ou intérpretes do carisma, como se estivessem acima da Igreja. A atenção à pastoral vocacional e à formação que é proposta aos candidatos. A atenção e como é exercido o serviço de autoridade, nomeadamente no que se refere à separação entre foro interno e externo – tema que me preocupa tanto -, à duração dos mandatos e à acumulação de poderes. E a atenção aos abusos de autoridade e de poder.
“Sobre este último tema – acrescentou – tive em mãos um livro publicado recentemente, de Salvatore Cernuzio, sobre o problema dos abusos, mas não dos abusos gritantes; sobre os abusos de todos os dias que fazem mal à força da vocaçãoâ€.
Colaboração com os bispos
Quanto ao discernimento em vista da aprovação de novos institutos, de novas formas de vida consagrada ou de novas comunidades – acrescentou o Pontífice – “convido-vos a desenvolver a colaboração com os bispos diocesanosâ€:
E exorto os Pastores a não se assustarem e a acolherem plenamente o vosso acompanhamento. É responsabilidade do Pastor acompanhar-vos. Não recusar esse serviço. Esta colaboração, esta sinergia entre o Dicastério e os bispos permite também evitar - como pede o Concílio – que surjam inoportunamente institutos privados de suficiente motivação ou de adequado vigor, talvez com boa vontade, mas lhe falta algo. O vosso serviço é precioso para buscar oferecer aos Pastores e ao Povo de Deus critérios válidos de discernimento.
A escuta recíproca entre os escritórios da Santa Sé e os Pastores, bem como os Superiores Gerais – destacou ainda Francisco - é um aspecto essencial do caminho sinodal que iniciamos:
Mas, num sentido mais amplo e fundamental, diria que os consagrados e as consagradas são chamados a dar um importante contributo a este processo: um contributo que vem - ou deveria vir - da familiaridade com a prática da fraternidade e da partilha, quer na vida comunitária como no compromisso apostólico.
Ao concluir, o Papa Francisco agradeceu mais uma vez pelo serviço cotidiano que “levam em frente pelo discernimento e o acompanhamentoâ€, e concedeu a todos a sua Bênção, acompanhada pelos votos de um bom caminho de Advento e um Feliz Natal!
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