Papa na Roménia, alegria de ortodoxos e católicos
Rui Saraiva - Porto
A viagem de Francisco à Roménia foi a 30ª do seu pontificado e decorreu nos dias 31 de maio e 1 e 2 de junho. Foi uma viagem apostólica repleta de momentos ecuménicos intensos e significativos. Passados vinte anos após a visita de João Paulo II, o Papa regressou à Roménia, um país de maioria ortodoxa e onde os católicos são cerca de 7% da população.
Neste semestre a Roménia assume a presidência da União Europeia e olha confiante para o futuro, deixado que está para trás o passado comunista. A Roménia entrou oficialmente na União Europeia no ano 2007. Francisco encontrou-se com o presidente do país Klaus Werner Iohannis, e a primeira-ministra Vasilica Viorica Dancila.
Reforçar as raízes comuns da identidade cristã
De grande importância nesta visita do Papa o encontro com o Sínodo Permanente da Igreja Ortodoxa Romena. Francisco falou de uma fraternidade do sangue que ao longo dos séculos, como uma silenciosa corrente vivificante, nunca cessou de irrigar e sustentar o caminho dos cristãos. O Papa propôs diálogo e um caminho juntos “rumo ao futuro com a consciência das diferenças, mas sobretudo na ação de graças de um ambiente familiar que deve ser redescoberto, na memória de comunhão que se deve reavivar†– disse Francisco.
De seguida, teve lugar um belo momento, de grande significado ecuménico: a Oração do Pai Nosso na nova catedral ortodoxa, a Catedral da Salvação do Povo, inaugurada em novembro passado. Um momento vivido pelo Papa e pelo Patriarca Daniel. O Pai Nosso foi cantado em latim e em romeno. Francisco apelou ao reforço das raízes comuns da identidade cristã:
“ Ao pedir o pão de cada dia, suplicamos também o pão da memória, a graça de reforçar as raízes comuns da nossa identidade cristã, raízes indispensáveis num tempo em que a humanidade, particularmente as gerações jovens, correm o risco de se sentirem desenraizadas no meio de tantas situações líquidas, incapazes de fundamentar a existência†– afirmou o Papa.
Maria convida-nos a caminhar juntos
Com os católicos, o Santo Padre esteve na catedral de S. José em Bucareste e aí celebrou a Eucaristia na Festa da Visitação da Bem-Aventurada Virgem Maria. No interior e exterior da Catedral estavam presentes mais de 25 mil fiéis.
Na sua homilia, Francisco referiu que o Evangelho do dia narra o encontro de Maria e Isabel, sua prima. Maria que caminha e vai até à casa de Zacarias e Isabel. â€œÉ a primeira das viagens de Maria que narra a Sagrada Escritura†– disse Francisco sublinhando viagens importantes da vida de Maria como aquela até Belém onde nascerá o seu filho, Jesus, ou a fuga para o Egito e as viagens a Jerusalém.
O Santo Padre declarou que Maria é a “boa mãeâ€, “especialista em trabalhar duro†que nos toma pela mão nos momentos difíceis. O Papa recordou as mães e avós da Roménia que moldaram o presente e “tecem os sonhos do futuro†do país. Francisco salientou o “forte sentido de esperança†do povo romeno, “…no nosso povo, há espaço para a esperança. Por isso, Maria caminha e convida-nos a caminhar juntos†– disse o Papa.
Francisco colocou em destaque na sua homilia a “cultura do encontro†salientando que a jovem Maria procura a prima Isabel que era já de idade avançada. Contudo, Isabel, não obstante fosse uma pessoa já um pouco idosa, apresenta durante a visita de Maria uma visão de futuro “cheia do Espírito Santo†– disse o Papa exortando os fiéis a irem “para além das aparências†e a não terem medo de dialogar e encontrar quem professa ritos diferentes pois é daí que “acontecem grandes coisas†– disse o Santo Padre:
“Na Igreja, quando se encontram ritos diferentes, e em primeiro lugar não vêm as próprias filiações, o próprio grupo ou a própria etnia, mas o Povo que, junto, sabe louvar a Deus, então acontecem grandes coisas†– afirmou.
Francisco declarou na sua homilia que “Maria, que caminha e encontra Isabel, lembra-nos onde Deus quis habitar e viver, qual é o seu santuário e onde podemos auscultar as palpitações do seu coraçãoâ€. É â€œno meio do seu Povo†– afirmou o Papa. É aí, no meio do seu Povo que Deus habita, vive e nos espera – frisou o Santo Padre sublinhando, que por vezes, vacilamos na fé quando nos deixamos arrastar pela tristeza e pelo desânimo. Francisco afirmou mesmo que “o problema da fé é a falta de alegriaâ€.
No final da sua homilia, o Papa recordou as testemunhas de fé das “terras†romenas: “Pessoas simples, que confiaram em Deus no meio das perseguições. Não colocaram a sua esperança no mundo, mas no Senhor, e assim continuaram para diante. Quero agradecer a estes vencedores humildes, a estes santos de ao pé da porta que nos apontam o caminho. As suas lágrimas não foram estéreis, foram oração que subiu ao Céu e irrigou a esperança deste povoâ€.
Abrir estradas para caminhar juntos
No dia 1 de junho, na cidade de Iasi, o Papa Francisco encontrou-se com os jovens e com as famílias da Roménia. Começou por sublinhar no seu discurso a comemoração do Dia da Criança e pediu com um aplauso o direito das crianças a terem futuro.
Perante uma assembleia constituída por diversidades culturais, linguísticas e nacionais, pois estavam presentes fiéis, por exemplo, de língua polaca e russa, Francisco exortou todos a caminharem juntos encontrando-se como irmãos:
“O Espírito Santo convoca-nos a todos e ajuda-nos a descobrir a beleza de estar juntos, de nos podermos encontrar para caminhar juntos; cada qual com a sua própria língua e tradição, mas feliz por se encontrar entre irmãos†– afirmou o Santo Padre.
â€œÉ a experiência de um novo Pentecostesâ€, que é difícil de percorrer “caminhando juntos†– disse o Papa – mas igual àquele “caminho que encetaram os Apóstolos há dois mil anos†– observou.
Um caminho que se deve iniciar não tendo medo de sonhar para construir o futuro não esquecendo as “raízes†e mantendo viva a fé:
“Mas, a fé é um dom que mantém viva esta certeza profunda e estupenda: a nossa pertença a Deus como filhos, e filhos amados por Deus†– disse o Papa.
Segundo o Papa “existe uma rede espiritual muito forte que nos une, «conecta» e apoia, sendo mais forte do que qualquer outro tipo de conexãoâ€. E esta rede “são as raízesâ€. “Porque o amor cria raízes e convida-nos a criá-las na vida dos outros†– declarou Francisco.
O Santo Padre afirmou que sem amor e sem Deus não se pode viver e aí será mesmo o fim do mundo:
“Quando as pessoas já não amarem, será verdadeiramente o fim do mundo. Porque sem amor e sem Deus nenhum homem pode viver sobre a terra†– disse o Papa.
O Santo Padre no final do seu discurso às famílias e aos jovens da Roménia afirmou que usar a liberdade para dizer sim a um “projeto de amor†é ter uma “liberdade muito maior do que poder consumir e comprar coisas†– assinalou Francisco que, invocando a vocação cultural daquela cidade de Iasi, pediu a todos para abrirem estradas de amor para caminharem juntos:
“… abrir estradas para caminhar juntos e levar por diante aquele sonho que é profecia: sem amor e sem Deus, nenhum homem pode viver sobre a terra†– afirmou Francisco.
O Papa Francisco presidiu no domingo dia 2 de junho à celebração de beatificação de sete bispos romenos, considerados mártires pela Igreja Católica. Estes bispos sofreram a opressão do regime comunista que dominou a Roménia durante grande parte do século XX. O Santo Padre chamou-lhes testemunhas de liberdade e misericórdia.
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