Editorial: é: um grito de esperança
Silvonei José - Cidade do Vaticano
Nestes dias, os bispos da Nigéria estão no Vaticano para a sua visita ad limina. Um primeiro grupo de bispos já se encontrou com o Papa nesta semana. Enquanto isso, a tensão no país africano permanece alta após o ataque à paróquia de Santo Inácio de Ukpor-Mbalom, que matou 18 pessoas. “Assim começou em Ruanda”, disse Dom Avenya, bispo de Gboko.
O encontro dos bispos com Francisco ocorreu dois dias depois do sangrento ataque contra a comunidade católica nigeriana.
Mas o que ocorreu? Na madrugada de terça-feira, 24 de abril, dois sacerdotes e pelo menos 16 fiéis foram assassinados em uma operação armada durante a celebração da missa na paróquia de Santo Inácio de Ukpor-Mbalom, na aldeia de Mbalom, pertencente à diocese de Makurdi, no Estado de Benue. Essa região faz parte do chamado Cinturão do Meio, a parte central do país que divide o norte com a preponderância muçulmana, do sul amplamente habitada pelos cristãos. Depois de atacar a igreja, os bandidos entraram na aldeia e destruíram mais de 60 casas e celeiros. Os habitantes fugiram para as aldeias vizinhas, na esperança de encontrar um refúgio seguro.
Controlar recursos hídricos
Os autores do massacre são os pastores nômades muçulmanos do grupo étnico Fulani que cada vez mais tentam se apropriar das terras férteis cultivadas pelos camponeses de fé cristã. A violência não depende apenas de motivos religiosos, mas também da vontade de controlar os recursos hídricos.
A maioria dos ataques no centro do país ocorreu no Estado de Benue, onde cerca de 385 pessoas foram mortas desde janeiro, de acordo com a organização estadunidense especializada no conflito armado Armed Conflict Rental e Event Data Project. Segundo a organização humanitária Human Rights Watch, desde 2010 as violências já causaram pelo menos 3 mil mortes.
Após este último ataque, o parlamento nigeriano convocou o presidente Muhammadu Buhari para informar sobre as medidas tomadas para conter a crescente violência nos estados centrais. Membros da Câmara Baixa do Parlamento também pediram "a substituição dos chefes do exército e assessores de segurança".
Acabar com a série de assassinatos
O presidente Buhari, que também é o comandante em chefe das forças armadas, "deve responder às perguntas pertinentes sobre o que o executivo está fazendo para acabar com a série de assassinatos em vários estados da Federação" da Nigéria, escreveu em um tweet o presidente da câmara, Yakubu Dogara.
Mas a dor desse povo é mais profunda. “O mundo não está nos ouvindo. Assim começou em Ruanda: o mundo não escutou. Assim também começou na Alemanha, há muitos anos: o mundo estava surdo. E é isso que está ocorrendo conosco. Queremos que o mundo nos ouça: estamos em perigo”: um grito de alarme lançado por Dom Wlliam Avenya, bispo de Gboko ao Pope.
Dom Avenya refere-se à brutalidade desse último ataque: “Nem mesmo uma pessoa foi capturada. Não se pode imaginar que um grupo de pessoas chegou a uma aldeia, incendiou-a, matou pessoas, destruiu propriedades, como aconteceu na terça-feira, em plena luz do dia. Tudo isso aconteceu e depois foram embora, livres!”
O prelado então levanta questões sobre essas violências que parecem não ter fim: “Tenho certeza de que alguém os protege. Eles não são tão invencíveis. E a pergunta: o que podemos fazer? Essa é uma das coisas que podemos fazer, porque as aldeias e essas áreas são principalmente rurais. E as pessoas que moram lá não têm voz; se nem mesmo a Igreja não pode defendê-los, então estamos verdadeiramente em perigo”.
Chamar a atenção do mundo
O bispo de Gboko volta então a chamar a atenção da comunidade internacional afirmando que a Igreja está fazendo grandes esforços e que ela deveria ser ouvida. Esta situação dramática deveria chamar a atenção do mundo civil. O mundo deve saber que esse povo está diante do risco de genocídio, um povo minoritário que vive no meio rural. Isso é o que está ocorrendo. “E é por isso que precisamos dos instrumentos da Igreja para despertar e sensibilizar as pessoas de tal maneira que se encontre uma solução duradoura e estável”, disse o bispo.
“As instituições parecem incapazes ou intencionalmente incapazes e deliberadamente incapazes” - afirma ainda o prelado. E conclui: “Somos um povo de esperança, um povo da ressurreição. Continuamos a recordar isso ao nosso povo: o nosso Deus é maior do que qualquer projeto humano. Mas nesse meio tempo as pessoas morrem, são feridas, os meios de subsistência são destruídos. E eles nos perguntam: por quê?
O grito de dor e esperança, de socorro foi lançado, cabe a quem tem ouvidos ouvir e agir, antes que seja tarde de mais para um povo, uma nação, um continente.
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