Campanha da Fraternidade, modo brasileiro de viver a Quaresma
Jackson Erpen - Cidade do Vaticano
O lançamento da Campanha da Fraternidade na Quarta-feira de Cinzas deste ano foi enriquecida com uma mensagem do Papa Francisco, onde entre outras coisas, diz:
"Como irmãos e irmãs - destacou o Santo Padre - somos convidados a construir uma verdadeira fraternidade universal que favoreça a nossa vida em sociedade e a nossa sobrevivência sobre a Terra, nossa Casa Comum, sem jamais perdermos de vista o Céu, onde o Pai nos acolherá a todos como seus filhos e filhas."
Inspirado no tema da Campanha deste ano, Pe. Gerson Schmidt* nos propõe hoje a reflexão: "Campanha da Fraternidade, modo brasileiro de viver a Quaresma":
"A Campanha da Fraternidade é um modo brasileiro de celebrar a Quaresma, preparativa para a Páscoa – passagem da morte para a Vida. É preciso ressuscitar também nosso ambiente ao nosso redor, mudando as estruturas não fraternas, lá onde o Evangelho ainda não iluminou os critérios de bem viver, conviver e viver de maneira digna, justa e solidária. O ambiente onde a pessoa vive influencia seu modo de proceder. Por isso, a Constituição Sacrosanctum Concilium (SC, 110) aponta que a “penitência quaresmal deve ser também externa e social, não só interna e individual”.
Nesse ano, inspirada na Encíclica do Papa Francisco a Campanha da Fraternidade (CF) tem como tema: “Fraternidade e Amizade Social” e o lema: “Vós sois todos irmãos e irmãs” (Mt 23, 8). A Campanha da Fraternidade propõe durante a Quaresma desse ano um convite de conversão para a amizade social e a busca de que todos sejam irmãos e irmãs, todos fraternos e tudo fraterno, numa fraternidade universal, tal como cantou São Francisco de Assis, tal como inspira o título da Encíclica Papal Fratelli tutti, lançada na véspera da festa de São Francisco.
A Campanha da Fraternidade no Brasil já completa mais de 60 anos. Teve início, de maneira regional, na Arquidiocese de Natal (Rio Grande do Norte) justamente quando no Vaticano, em Roma, no ano de 1962, iniciava-se o Concílio Vaticano II. A Campanha da Fraternidade do Brasil sempre esteve ligada ao Concílio. A bela iniciativa da Campanha da Fraternidade teve início em 1961, quando três padres que trabalhavam na Cáritas Brasileira planejaram uma campanha de arrecadação de recursos para financiar as atividades assistenciais da instituição. Diga-se aqui, aos nossos irmãos de língua portuguesa – que acompanha a Rádio Vaticano – e que não são brasileiros que a Cáritas Brasileira é uma entidade eclesial Católica que promove ações de solidariedade nacionais e internacionais para o atendimento à comunidades afetadas por desastres socioambientais ou que estão em situação de vulnerabilidade. É uma entidade de cunho social.
A iniciativa da Campanha da Fraternidade foi concretizada pela primeira vez na Quaresma de 1962 na cidade de Natal, no Rio Grande do Norte. Devido ao bom êxito da experiência, no ano seguinte, 16 dioceses do Nordeste também realizaram a campanha em suas comunidades, unindo-se a essa exitosa experiência. Ainda em 1963, no dia 26 de dezembro, o secretário-geral da CNBB, o famoso e saudoso dom Helder Camara, enviou carta circular a todos os bispos comunicando que a CF de 1964 seria em âmbito nacional e teria como tema “Lembre-se você também é Igreja”. É curioso que transcorridos mais de 60 anos, esse tema “Lembre-se você também é Igreja” é tão vivo e atual, pouco ainda consciente em nossas paróquias. Esse tema era fruto do Concílio, da importância dada ao leigo na Igreja que era recuperada nas declarações e reflexões do Concílio. Não é por nada que o Papa pede essa retomada no Ano Jubilar.
O projeto da Campanha da Fraternidade nacional foi crescendo ano após ano, alcançando os estados de outras regiões do país. A CNBB, fundada em 1952, então começou a estruturar e fundamentar a iniciativa para estender a Campanha da Fraternidade a todas as dioceses do Brasil. Como no mesmo período estava acontecendo o Concílio Vaticano II (1962 a 1965), quando representantes da Igreja Católica discutiram e regulamentaram vários assuntos em Roma, a pauta brasileira foi apresentada e aprovada. A cada ano, a CNBB escolhe um tema relevante da sociedade brasileira em que julga a necessidade de maior Fraternidade Social, compromisso com os pobres, desafio de mudança externa, com a busca de maior justiça com os critérios do Evangelho, gestos concretos de transformação e que expressem uma verdadeira conversão, que sempre parte de uma decisão pessoal, interior e radical, mas que deve ser traduzida em atitudes concretas de mudança externa. Não podemos pensar somente numa mudança pessoal.
A Campanha da Fraternidade, no desafio da terceira prática quaresmal e penitencial da Quaresma, que é a esmola, além do Jejum e oração, amplia desta forma a esmola com uma verdadeira caridade fraternal, numa grande campanha nacional em todas as quaresmas. Não podemos ser simplesmente doadores de esmolas, para alívio de consciência e no repasse de uma pequena e descomprometida oferta. Há uma necessidade de envolver-se com o outro. Precisamos fazer mais do que simplesmente doar o que nos sobra, deixando cair algumas migalhas a mais em nossas mesas.
Pe. Zezinho, sacerdote da Congregação do Sagrado Coração do Jesus, padre-cantor e compositor brasileiro, famoso também no exterior, sacerdote pioneiro em canções religiosas no Brasil, canta assim na música intitulada “Ensina-me a amar os pobres”, de sua autoria: “é muito mais fácil dar, do que se comprometer e de novo acolher e de fato mudar – Converte o meu coração, aos pobres a quem tanto amas, a ser também pobre me chamas, converte o meu coração”. Que a Campanha da Fraternidade de 2024 que pede uma amizade social, ajude a ver nos pobres e necessitados verdadeiros irmãos e irmãs como anuncia o lema da Campanha - “Vós sois todos irmãos e irmãs” (Mt 23, 8).
*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
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