Padre Gazzera na Rep¨²blica Centro-Africana: nunca imaginei ser bispo
Antonella Palermo - Pope
Um compromisso "enorme" para o qual ele conta com as orações de muitos. É o que conta em entrevista ao Pope Padre Aurelio Gazzera, missionário dos Carmelitas Descalços na República Centro-Africana há mais de 30 anos. Na sexta-feira (23), ele foi nomeado pelo Papa Francisco bispo coadjutor de Bangassou.
"Quanto mais leio e estudo, mais me sinto pequeno e incapaz", escreve ele da pequena cidade de Bouar, em uma postagem no blog que edita há muitos anos: há toda a humildade de um religioso totalmente imerso na vida espiritual, mas capaz de manter os pés firmes no chão, muitas vezes se esquivando das armadilhas de uma guerra que nunca foi contida no país, ao lado dos vulneráveis em defesa da justiça e da dignidade. A viagem que aguarda o Padre Aurelio é do noroeste, onde ele está agora, para o sudeste, para chegar a uma diocese de 135 mil quilômetros quadrados, muito arriscada devido à guerra que ainda semeia armadilhas e para a qual duas missões ainda estão fechadas. A entrevista foi feita por telefone:
Como o senhor recebe a nomeação, Padre Aurelio?
Com muita alegria e muito medo, porque é um compromisso enorme assumir esse ministério em uma diocese que é quase tão grande quanto a metade da Itália. Estarei com um grande bispo com quem trabalharei pelo menos por algum tempo, dom Aguirre, um espanhol que realmente faz milagres lá. Teremos de tentar dar continuidade a uma diocese que é tão vasta e tão distante. Na verdade, ela fica a apenas 750 Km da capital, mas não há estradas, então é preciso ir de avião; os caminhões levam um ou dois meses para chegar lá, então fazemos o que podemos. E é uma diocese com paróquias espalhadas, em muitas das quais ainda há grandes problemas de segurança, com milícias rebeldes em ambos os lados do país. O trabalho e o compromisso são grandes, por um lado, há um pouco de medo de não estar à altura da tarefa, mas, por outro, há também o dom da graça do sacramento, a misericórdia de Deus e, acima de tudo, a oração e o carinho de tantas pessoas que me inundam com mensagens, escritos...
O senhor também sente o medo de uma maior exposição que, como bispo, inevitavelmente deverá experimentar?
O medo não é tanto em relação à minha pessoa. Pode haver violência, certamente, fatos mais ou menos graves. Mas o medo não é tanto esse, mas, acima de tudo, o de poder prestar um bom serviço ao que agora é meu povo. Acabei de terminar uma reunião com os seminaristas mais velhos da diocese, que estão aqui na capital: 15 rapazes que estão estudando filosofia e teologia, e é uma das primeiras coisas que queríamos fazer juntos, vir cumprimentá-los. São eles, de certa forma, a esperança da Igreja, e também haverá o trabalho de cuidar de todos os sacerdites e seminaristas que estão espalhados nessa grande porção da Igreja de Deus que está em Bangassou.
Que realidade o senhor deixa para trás?
Estou aqui na República Centro-Africana há 33 anos. Trabalhei cerca de 10 anos como diretor do Seminário Menor. Os rapazes daqueles anos lá são agora os novos Superiores da Missão. O provincial do país foi transferido, ele entrou no seminário quando eu era reitor. Há também o trabalho feito durante 17 anos em Bozoum como pároco, uma grande graça com todas as suas coisas bonitas, mas também com todas as suas dificuldades, como os tempos de guerra, a acolhida dos refugiados, a mediação com os vários grupos para tentar salvar vidas. Há também o compromisso como Caritas, com as feiras agrícolas, ajudando o maior número possível de pessoas durante esses longos anos. Depois, nos últimos três anos, nos pequenos vilarejos que acompanho, a escola de mecânica. Tudo o que a graça do Senhor concede fazer.... Ontem eu estava pensando que, quando o Senhor chama, Ele sempre dá muito. Eu nunca teria pensado em fazer algo do gênero, e absolutamente nunca pensei em me tornar um bispo. Faremos o que pudermos, com a ajuda de Deus e com as orações de muitas pessoas.
A guerra é sempre um incômodo...
Infelizmente, ainda temos áreas do país que estão continuamente expostas a ataques. Dom Aguirre me dizia que há áreas em que, se houver estradas, é fácil encontrar rebeldes e pessoas armadas. Uma grande parte do país está realmente fora de qualquer critério de segurança. O governo, honestamente, faz pouco. A Corte Internacional faz o que pode, há um grande compromisso da ONU, mas esses compromissos não dão muitos frutos na prática. Em vez disso, acho que o grande fruto é esse esforço que as Igrejas, em particular, estão fazendo na educação, no incentivo a encontros, na tentativa de acalmar os ânimos e alcançar a verdadeira reconciliação. Esse é um grande trabalho, que não pode ser quantificado, mas que o Senhor nos ajuda a fazer.
O que é necessário para uma verdadeira reconciliação?
Desarmar os corações e as mãos. E, então, este é um país que precisa de estruturas, que precisa de desenvolvimento. Em vez disso, não vemos nenhum compromisso. As estradas, como eu disse, estão cada vez mais em desordem, na própria capital. Se pensarmos que são necessárias duas semanas de carro para percorrer 750 quilômetros, na estação seca, isso significa que não há nenhuma estrutura. É necessário um compromisso mais sério, não tanto da comunidade internacional quanto das autoridades locais.
Estamos no limiar de um novo Jubileu. Recordamos em 2015 a abertura do Jubileu da Misericórdia em Bangui. Depois de 10 anos, como irão viver esse novo evento eclesial?
Certamente será uma oportunidade para sempre voltarmos ao centro de nossas vidas, que é Jesus, para voltarmos às raízes de nossa fé, para voltarmos a nos concentrar nas coisas mais importantes. Certamente será um bom momento. Aqui, além disso, há uma grande riqueza de manifestações externas de fé e oração.
Como podemos viver a missão à luz do carisma carmelita?
A vida de missionário é o maior presente que recebi. Estes dias eu estava dizendo à minha família carmelita que no Carmelo recebi o dom da missão, desde os primeiros passos até poder viver aqui. Há certamente o aspecto da oração e da vida espiritual. Curiosamente, o aspecto missionário sempre foi muito forte em nosso carisma. E assim continuaremos, com a graça de Deus e as orações de muitos e muitas.
O senhor às vezes sente solidão?
Bento XVI dizia que aquele que reza nunca está sozinho, aquele que tem Deus nunca está sozinho. É claro que terei de deixar meus irmãos, mas, no momento, isso é o que menos me assusta.
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