Cardeal Martini: um intelectual e pastor no diálogo
Alessandro Di Bussolo – Pope
Mestre e amigo. É assim que o padre Virginio Colmegna, conhecido como o "padre das comunidades", milanês de 77 anos, recorda o cardeal Carlo Maria Martini, dez anos após sua morte, e 20 anos após a comovedora despedida na Catedral de Milão. Dom Martini convidou padre Colmegna a dirigir a Cáritas Ambrosiana em 1993 e em 2004 ele fundou a Casa da Caridade, o legado que o arcebispo jesuíta deixou a Milão. Padre Colmegna considera o Cardeal Martini "um professor e um amigo", que, afirma na entrevista concedida ao Pope, "educou minha consciência, assim como tantas outras consciências de crentes".
Entrevista
Qual é a sua recordação mais viva de Carlo Maria Martini? Qual encontro, quais de suas palavras ainda ressoam no seu coração?
São muitas as palavras que ressoam, especialmente do início, quando Martini chegou a Milão (em fevereiro de 1980, n.d.r.) e eu lhe escrevi pela primeira vez. Eram tempos difíceis, de grandes tensões, inclusive sociais, e eu pedi para falar com ele. Ele até propôs que eu fosse ao episcopado para passar com ele três dias, e então, juntos, descobriríamos o mandato que ele havia pensado para mim. Após um momento de oração, me disse: 'Vá e colabore no bairro Sesto San Giovanni com os deficientes'. Daí nasceu todo o sentido da minha vida sacerdotal, a descoberta de que até mesmo as escolhas de compromisso, de solidariedade, de proximidade, nascem desta escuta do Espírito que ilumina. Martini me ensinou desta maneira. Quando o conheci, o conceito de autoridade mudou para mim: ele não era autoritário, mas tinha autoridade, uma pessoa que ensina, ele realmente se tornou um professor, que também educou minha consciência. Como tantas outras consciências de crentes, marcadas pela Palavra ouvida, vivida, rezada.
O senhor disse que não seria um sacerdote tão alegre se não tivesse conhecido o Cardeal Martini, que lhe devolveu a alegria de ser sacerdote. Por que o encontro com ele o marcou tanto?
Porque realmente me deu o sentido de uma vocação, que é capaz de encontrar suas raízes na totalidade da resposta, em um Evangelho que fala. Principalmente nesta época em que a palavra é uma palavra com um 'p' minúsculo, que todos a usam, não lhe dão o devido crédito, o encanto, o envolvimento essencial. Isso, ser marcado pela beleza do Evangelho, que depois envolve a própria vida. Falo isso pela minha primeira experiência com ele, mas também quando me enviou para o bairro Sesto San Giovanni, na Comunidade Parpagliona para deficientes, em uma igreja suburbana, lembro que ele ia lá, na minha comunidade: chegava à noite, de improviso. E também com os últimos, os frágeis que estavam ali, marcados pela fadiga, ele tinha palavras capazes de abrir espaços para a credibilidade do Evangelho. Eis então a alegria de ser sacerdote, mesmo jovem, que dava tudo, não era apenas para uma operação social de ajuda, era também isto, mas sobretudo para descobrir a vitalidade do Evangelho, a beleza de ser - uso esta palavra forte - "consagrados ao Evangelho". Fui chamado muitas vezes de "sacerdote dos últimos": não, somos sacerdotes marcados pela beleza do Evangelho, por este lugar teológico, que é a pobreza, que são os pobres, os últimos. Este frescor da Igreja conciliar, creio ter experimentado como um grande dom.
O senhor falou do Evangelho, da Palavra de Deus, que era o centro do magistério do Cardeal Martini. Para ele, o diálogo era "fundamental como parte constitutiva da busca da verdade". Este ensinamento ele sempre extraía da Palavra de Deus?
Sim, esta Palavra de Deus que depois se tornava palavra viva em um diálogo. Ele preferia sempre, ao invés da distinção entre "crentes e não crentes", a dos "pensadores e não pensadores". A fecundidade do Evangelho a ser anunciado, que neste tempo de sofrimento vive o Papa Francisco, e que Martini viveu em profundidade, é de uma Igreja que deixa espaços de profecia. Mas esta é a Palavra vivida, cantada, celebrada. Afinal, todos nós aprendemos Lectio divina com Martini: naquela Catedral cheia de jovens lendo, meditando com ele. E também o compromisso de refazer estratégias. Aprendi muito com o cardeal Martini na última fase da vida, o da fraqueza, o da fragilidade. Às vezes se esquece disso. Ele me ensinou o sentido dos limites: quando ia visitá-lo em Gallarate (Milão), ele apertava minha mão afetuosamente. Padre Damiano Modena, seu secretário e assistente de 2009 até sua morte, me ensinou precisamente isto, ele que o acompanhou nos últimos tempos de sua vida: que em Martini havia ternura. Dele, recebi uma grande amizade... Lembro-me quando os migrantes ocuparam uma igreja pela primeira vez, Martini me telefonou imediatamente, dizendo: 'Não chame a polícia, tente dialogar até o fim com eles, para convencê-los a não forçar um confronto'. Foram dias de diálogo e, no final, conseguimos. E sua felicidade foi que conseguimos esvaziar a igreja, como tínhamos que fazer, mas deixando-a com maior capacidade de diálogo. Um diálogo que atravessa também fronteiras, que traz mansidão e capacidade de resposta.
Sim, uma alegria e um sentido ao sofrimento que ele conseguiu encontrar mesmo nos últimos anos difíceis da sua doença, desde 2008, como lembra também o padre Damiano...
Quando fui visitá-lo em Gallarate, mas também quando fomos a Jerusalém, onde viveu depois de Milão, com dois ônibus da Casa da Caridade, que estava no início, ele ficou muito impressionado, deu-nos uma lição extraordinária sobre a excedência da caridade, uma caridade que vai além dos limites e entra em você com a alegria da gratuidade. Que não tem idade, mas que respeita a fragilidade das diferentes estações da vida. Muitas vezes esquecemos o Martini dos últimos tempos: não é o Martini conhecido. Era o cardeal que, quando o Papa Bento XVI veio a Milão em 2 de junho de 2012, quis ir ao seu encontro, uma última vez, com tanto esforço, e já não se entendia bem as suas palavras, como me contou o padre Damiano. No entanto, ele queria entregar a Bento XVI, quase profeticamente, este amor pela Igreja que precisava de mudanças, e o sofrimento que vivia. E acredito que o Papa Francisco acolheu este sinal e deu continuidade a este desejo culto, cotidiano e laborioso que Martini vivia dentro de si mesmo. Ele me ensinou muito.
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