ÃÛÌÒ½»ÓÑ

Busca

Dom Enrico Angelo Angelelli Carletti  Dom Enrico Angelo Angelelli Carletti  

M¨¢rtires de La Rioja ser?o beatificados s¨¢bado na Argentina

"O testemunho deve envolver toda a vida. Os primeiros crist?os entenderam logo isto, quando perceberam que o pedido de Jesus para ser suas testemunhas tinha a ver com compartilhar seus sofrimentos, incluindo a morte", escreve Padre Quique Bianchi.

Cidade do Vaticano

No próximo sábado, 27, serão beatificados em La Rioja,  Argentina, quatro mártires da década de 70: um bispo, dois sacerdotes e um leigo. Em preparaçãoà celebração, foram inauguradas na Praça 25 de maio, espaços temáticps que receberam a benção do bispo diocesano, Dom Dante Braida. Ele estava acompanhado por representantes da ¡°Comisión de Espacios Plurales de Celebraciones y Encuentros¡±, responsáveis pela organização.

Trata-se de quatro grandes tendas com os nomes de cada um dos mártires riojanos: o bispo Dom Angelelli, padre Carlos de Dios Murias, padre Gabriel Longueville e o leigo Wenceslao Pedernera, que buscam refletir sobre suas vidas e ação pastoral no contexto social e político do ano de 1976.

Em vista das beatificações, o Padre Quique Bianchi, da Diocese de San Nicolás,  publicou o seguinte artigo no blog ¡°Vivamos juntos la fe¡±:

¡°Jesus Cristo é o mártir por excelência. Ele veio como testemunha do amor misericordioso de Deus e, em humilde submissão à vontade do Pai, sustentou seu testemunho até o doloroso resultado na cruz. Com sua paixão e morte, ele oferece sua vida como um sacrifício redentor para reconciliar a humanidade com Deus. Para nós, através do batismo, que nos pertencer a Cristo, nos é dada a graça de compartilhar os frutos desse sacrifício sem qualquer sofrimento de nossa parte.

Os cristãos são chamados a ser "testemunhas" desta salvação (do grego, ¦Ì?¦Ñ¦Ó¦Ô¦Ñ¦Å?, mártires.):  ¡°Receberão a força do Espírito Santo, que descerá sobre vós, e sereis minhas testemunhas" (Atos 1, 8). O que é característico da palavra testemunho é que ela não é oferecida como um sistema de ideias, cujas afirmações são baseadas em evidências externas para a pessoa que as profere. Pelo contrário, um testemunho se apresenta como crível, somente se a pessoa que o sustenta o é. Por isso, ser testemunhas de Cristo não é algo que pode ser sustentado somente com os lábios. O testemunho deve envolver toda a vida.  Os primeiros cristãos entenderam logo isto, quando perceberam que o pedido de Jesus para ser suas testemunhas tinha a ver com compartilhar seus sofrimentos, incluindo a morte. Tanto que ¨C desde o testemunho do sangue de Estêvão - chamaram de mártir (testemunha) por excelência ao que morria para defender a sua fé (cf. At 22, 20).

Os mártires sempre foram fonte de graça na vida da Igreja. Que existam cristãos capazes de encarnar o Evangelho de tal maneira - que colocam o amor de Cristo antes de sua própria subsistência - é uma poderosa força de inspiração. Suas vidas oferecidas são uma espécie de "prova" da plenitude oferecida pela fé cristã. Deste modo, o sangue dos mártires, misturado com o sangue de Cristo, desperta nossa fé, credibiliza a Boa Nova que trouxe Jesus e que a Igreja transmite. Disto a feliz sentença de Tertuliano: "Sangue dos mártires, semente dos cristãos".

A beatificação dos mártires de Rioja, Enrique Angelelli, Wenceslao Pedernera, Carlos de Dios Murias e Gabriel Longueville, diz-nos que na Argentina - em sua história recente ¨C também se derramou sementes de cristãos. Nós sabemos como Deus é generoso quando  espalha sua semente: não somente a lança em terra fértil, mas entre pedras, espinhos e até mesmo na beira do caminho. Mas também sabemos que esta semente espera um bom solo para mostrar sua fertilidade. São muitos os que trabalham com entusiasmo para fazer germinar a memória desses mártires na vida da Igreja Argentina. Mas também devemos reconhecer que a frieza de alguns setores diante da iminente beatificação, sugere que ainda há muito terreno a ser preparado para obter o fruto dessa sementeira divina.

Talvez este silêncio tenha a ver com o que os mártires de La Rioja nos obrigam a falar sobre o que não se fala. Como quando em uma família há um problema doloroso que todo mundo tem presente e ninguém quer revolver. A dificuldade de falar destes mártires parece estar relacionada com a profundidade da ferida deixada na sociedade Argentina pela violência política e terrorismo de Estado dos anos 70. Ainda hoje, é difícil falar serena e sinceramente da responsabilidade da Igreja naqueles anos sombrios. Este silêncio faz, por exemplo, que em alguns ambientes ainda siga vivo o mito de uma "Angelelli comunista" e não consegue evitá-lo, nem o fato de que não tenham surgido evidência de seu suposto apoio a grupos violentos, nem o fato de que a justiça sentenciou que foi assassinado em um ato de terrorismo de Estado, nem ¨C o que é mais grave, em se tratando de gente de Igreja - o fato de que a Congregação para as Causas dos Santos levou adiante um processo de beatificação, confirmado pelo Sumo Pontífice.

Também pode-se pensar que os mártires de La Rioja não só nos mostram que a ferida não se fecha, mas revelam também nossa incapacidade de rever nossas posições. Se ninguém está disposto a reconhecer que sua perspectiva precisa ser complementada com outra perspectiva, qualquer tentativa de diálogo ou qualquer nova pesquisa histórica  torna-se supérflua. O pior é que essa falta de atitude crítica nos deixa indefesos diante das forças que buscam polarizar a sociedade para dominá-la (polarização que parece ser um fenômeno comum em muitas sociedades modernas). A sabedoria popular conhece esse perigo, tanto que canonizou a sentença de Martín Fierro que adverte isso: "Que os irmãos sejam unidos porque essa é a primeira lei. Tenham uma união verdadeira em qualquer tempo que seja, porque se lutarem entre eles, serão devorados pelos de fora."

No último Concílio, a Igreja definiu a si mesma como signo e instrumento da unidade da raça humana (cf. LG 1). Se a semente dos mártires tem o força do evento redentor de Cristo, por que não confiar que seja capaz de aproximar posições na Igreja e que isso tenha um efeito difuso sobre a sociedade como um todo? Por que não sonhar que o sangue dos mártires riojanos se torne uma semente de unidade para os argentinos?

Nos mártires de La Rioja, temos novos intercessores. Peçamos a eles, como Igreja, que obtenham de Deus para nós a graça de ser terreno fértil para sua semente. Que seu sangue derramado seja uma sementeira de amor e unidade para o povo argentino. Por trás de cada martírio há um ódio homicida, mas isso não pode ser o que domina a cena. Nosso povo está bastante ferido com a semeadura de ódio daqueles que procuram dividi-lo. A Igreja quando lê a Paixão, coloca o foco sobre o amor superabundante de Cristo, não no rancor de seus algozes (Hans U. von Balthasar diz que ¡°a ¡®traição¡¯ dos homens não pode ser em todo este acontecimento acontecer, senão um fator segunda ordem", Mysterium salutis III, 720).

Nesta semeadura, o amor dos mártires deve brilhar de um modo que misericordiosamente que envolva misericordiosamente  o pecado de suas mortes. Sirva como inspiração a atitude de outro bispo da época ¨C que talvez com o tempo seja reconhecido como mártir -, Carlos H. Ponce de Leon, que enquanto as autoridades militares se referiam a ele em relatórios de inteligência como alguém de "atividades subversivas" que dirigia " forças alistadas substancialmente nas fileiras do inimigo "(sic), declarava em seu testamento:" não ter inimigos, não guardar rancor ou odiar pessoa alguma; se ofendi alguém, peço perdão e se alguém se considera um devedor, fica perdoado ". Igualmente permeada de Evangelho são as palavras se Wenceslao Pedernera em sua agonia, dirigidas a sua filha: "perdoem e não guardem rancor, não odeiem, eu os perdoo."

Obrigado por ter lido este artigo. Se quiser se manter atualizado, assine a nossa newsletter clicando aqui e se inscreva no nosso canal do WhatsApp

24 abril 2019, 16:00